sábado, 19 de novembro de 2022

ancoragem no acaso

mordi a isca enganchada a oeste do pensamento,
no mesmo lado onde está o coração concreto,
em que se fala em profecias, pertencimento
e viver grandes momentos
(com o perdão pela quebra de paralelismo).

meu eu desdobrado é esse espectro que flutua
e navega e mergulha as águas frias e fundas do intelecto.
não apenas pensamentos, elas também são emoções,
e desse caldo espesso e misterioso ressinto
a - no muito mais das vezes - solitária travessia.

não somos bondosos nem puros, disse a outra,
voz incógnita no turbilhão de conteúdos.
mas o gancho me atraiu precisamente com a ideia
de uma nova ética, radical e simples:
a alma existe, importa e necessita de amor.

o que será do amor sem a coragem da bondade?
o que será do amor sem a pureza da intenção?
amor é ação respeitosa, que promove o crescimento
e não se mistura com abuso, violência, negligência.

"há barcos para muitos portos, mas nenhum para a vida não doer,
nem há desembarque onde se esqueça."
pudera eu, poeta, me esquecer,
fingir que não foram assim
essas últimas três décadas
de navegar meu oceano dentro
e caminhar o deserto fora,
sem porto para um repouso,
sem fundo para descer a âncora,
sem água que mitigue a sede:
"solidão é lava que cobre tudo,
o amargor em minha boca sorri seus dentes de chumbo"...

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