sexta-feira, 29 de março de 2013

SOCORRAM-ME SUBI NO ÔNIBUS EM MARROCOS

(se você não conhece essa brincadeira, primeiro procure o que é um palíndromo - depois, divirta-se.)

Eu ia colocar o dramático título de "Socorro", mas aí me ocorreu essa brincadeira de infância, e a recordação encheu de sorrisos as minhas ideias, inicialmente melancólicas e desesperadas (pra variar).

Foi bacana, inclusive, ter tido essa lembrança, porque o elemento infantil e a consequente evocação de uma necessidade de cuidado combinaram perfeitamente.

Enfim - eu ia pedir socorro porque eu tento tento tento me livrar das complicações, mas elas sempre voltam pra mim. Sob as formas mais cuidadosas, gentis, belas e impossivelmente provocantes.

Eu devia mesmo era subir no ônibus pro Marrocos, e não voltar nunca mais.

(Desde que alguém fosse comigo pra cuidar de mim.)

(Não o alguém complicado - ninguém complicado, pelamordedeus.)

(Alguém bacana, só pra mim. Mas será que isso existe?)

domingo, 10 de março de 2013

O de sempre - é o que tem pra hoje

A saudade às vezes é um borrifado de spray, que eu sinto, com susto, me atingir o braço. Tipo um que minha mãe usa pra regar as plantas, e que de repente meu irmão mais novo aparece espirrando em cima de mim pra me irritar.
Às vezes, a saudade é aquela gota nojenta que cai bem no meio da nossa testa, pingada de algum ar condicionado perdido nos prédios da cidade. Eu, naquela pressa, correndo de um lado pro outro, e a gota maldita.
A saudade é, às vezes, uma garoa fininha, que a gente pega, desprevenido, no dia em que esquecemos de levar o guarda-chuva... Daquelas que enregelam a gente por dentro, e faz a gente querer um copo de chocolate quente, cobertor e sono sem sonho.
É, às vezes, a saudade, aquela tempestade inesperada, que varre a cidade, os prédios, as calçadas, as árvores, que faz a luz da vizinhança apagar, deixa tudo pavorosamente escuro, e alaga a avenida, não nos deixa atravessá-la, e nos aliena da chegada e do abrigo de casa.

A saudade é, muitas vezes, aqueles longos dias de chuva, cinzentos, parecidos com aqueles que o Bernardo Soares nos descreveu,

Chove muito, mais, sempre mais... Há como que uma […] que vai desabar no exterior negro...
Todo o amontoado irregular e montanhoso da cidade parece-me hoje uma planície, uma planície de chuva. Por onde quer que alongue os olhos tudo é cor de chuva, negro pálido.
Tenho sensações estranhas, todas elas frias. Ora me parece que a paisagem essencial é bruma, e que as casas (é que) são a bruma que a vela.
Uma espécie de anteneurose do que serei quando já não for gela-me corpo e alma. Uma como que lembrança da minha morte futura arrepia-me de dentro. Numa névoa de intuição sinto-me matéria morta, caído na chuva, gemido pelo vento. E o frio do que não sentirei morde o coração actual.

Ontem a saudade foi uma lembrança feliz no meio de um monte de músicas e danças;
Hoje a saudade foi um retrato voluntariamente olhado por un paio di minuti...

Amanhã, espero que a saudade seja o vento que passa, e que fala apenas sobre o vento que passa.


«Olá, guardador de rebanhos,
Aí à beira da estrada,
Que te diz o vento que passa?»

«Que é vento, e que passa,
E que já passou antes,
E que passará depois.
E a ti o que te diz?»

«Muita coisa mais do que isso,
Fala-me de muitas outras coisas.
De memórias e de saudades
E de coisas que nunca foram.»

«Nunca ouviste passar o vento.
O vento só fala do vento.
O que lhe ouviste foi mentira,
E a mentira está em ti.»

quarta-feira, 6 de março de 2013

Uma descoberta


Estou encantada com o poder de auto-conhecimento que a leitura nos traz.

Parece encheção de saco de quem vive puxando a sardinha pro estudo - papo de gente que, muitas vezes, só vive de papo, e não de realidade. Esse é o meu recalque juvenil falando.

Mas agora é sério.

É impressionante como que, de repente, você entende melhor uma fase significativa da sua vida. Isso porque você apenas estava buscando informações pra escrever um trabalho de literatura brasileira (que, ai deuses!, deve ser entregue amanhã). A frase é a seguinte:

"E como a literatura dificilmente se acomoda sem um paraíso perdido para os seus ideais, assim como os clássicos viveram do mito da Idade de Ouro e da Antiguidade perfeita, os românticos foram buscar nos países estranhos, nas regiões esquecidas e na Idade Média pretextos para desferir o voo da imaginação."

CANDIDO, Antonio. Formação da Literatura Brasileira (Momentos decisivos). 2º volume (1836-1880). São Paulo: Martins, [1969]. p. 23.

(O Candido é um fofo, sem mais.)

Apesar do sem-número de exemplos concretos da permanência do paraíso perdido romântico na mentalidade comum da contemporaneidade - e a exemplo dos românticos -, quero analisar a minha parte nesse processo.

Na verdade, eu não queria fazer nenhuma análise longa. Deixa isso pro trabalho. Não a análise pessoal, a análise literária, eu digo.

É que eu finalmente entendi qual a relação que se estabeleceu na minha juventude entre as novelas que eu via loucamente, as bandas de metal nórdico que eu ouvia loucamente (e a consequente vontade de conhecer a Finlândia), a melancolia que sempre me acompanhou (e que eu fazia questão de alimentar) e o Álvares de Azevedo, primeiro poeta que eu li, de fato.

(E eu continuei o trajeto literário, só pra complicar ainda mais, com a Florbela. Ô, juventudezinha maldita [literariamente, inclusive].)

Pronto, só queria falar isso. Estudar é muito legal, a gente conhece sobre o mundo e, de quebra, acaba conhecendo um pouquinho mais de nós mesmos. No fundo, acabam sendo ambos (mundo e indivíduo) uma mesma coisa.

Beijos :*