segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Othello juizforano (em que Cássio foi rei)

Um dia eu amei tão tão tão intensamente que, quando me deram a chance de possuir o que eu amava, eu simplesmente não quis. 

Eu queria aquele amar sofrido, de longe, difícil, em que cada dia guardava uma expectativa de talvez, quem sabe?, eu pudesse encontrá-lo pelos corredores da prisão escolar. 

Acho que foi quando eu mais amei. Morram de inveja todos vocês que eu nunca amei. O rei não foi nenhum de vocês. 


Curiosamente, ele tinha o nome do mais desassossegado dos seres. 

Hoje eu não faço nem ideia de onde o meu amado do passado esteja. Com ele se perdeu a minha chave do mistério de amar profundamente e sem vontade de casar. 

Claro que eu amei de novo. Mas só duas vezes. E, ao mesmo tempo que eu quero muito sentir isso de novo, tenho pânico de que isso aconteça. 

Mas bater o olho em alguém e, a partir daquele momento, sentir que não dá pra viver no mundo se o outro não existir, isso deve ser coisa coisa linda de se sentir mais uma vez. 

Não deve mais haver pureza de sentir pra mim, que não tenho 12 anos mais. 

Paene-umbra

Eu queria viver na penumbra.

A luz da penumbra tem uma aura diferente. Quando é tarde indo pra noite, os dias frios têm um respirar acinzentado. Essa é a penumbra de ficar debaixo dos cobertores, como em uma cabana, com uma xícara de chá, observando a janela, vendo a noite cair. Também pode ser uma luz incidental na janela da sala, em um cômodo bem amplo, cheio de ar frio, com uma fria luz de tela ligada em uma distração qualquer.

Quando é noite indo pro dia, a madrugada é sempre suficientemente fria e encantadora. A luz muito muito azul faz o ar virar água, a terra, oceano; e a vontade é de ficar vagando sem rumo certo pelas ruas desertas, como se os seres tivessem realmente desaparecido e o mundo estivesse pedindo para que começássemos tudo outra vez.

Essas luzes exóticas exercem um encantamento incomum.

Todas as luzes do dia são lindas e vibrantes, cada uma à sua proporção; às oito da manhã a luz é mansa, ao meio-dia ela é feroz, às quatro da tarde ela é morna.


As luzes da noite, gélidas como o corpo de Artemis, não são estéticas, são melancólicas. Nelas não ficam gravadas imagens, apenas sensações.


Dia e noite, ambos vulgares.

A penumbra do anoitecer frio e a do amanhecer, sempre fria, são uma mistura do que tem de melancolia na luz noturna e de estética na luz diurna. Pode ser isso que dê a elas um aspecto tão mágico.

(Mas a minha preferida há de ser a penumbra do amanhecer, porque ela não tem a agitação da vida lá fora. O entardecer é mar bravio; o amanhecer, oceano profundo.)


terça-feira, 9 de setembro de 2014

O buraco

Procurando por imagens que dessem uma dimensão plástica da sensação, tive várias vertigens virtuais.
Daí pensei na vertigem que é olhar para um buraco, ainda mais o vertiginoso olhar lançado ao buraco aberto no fundo da nossa alma.
É esse buraco que eu não ando querendo encarar.

O que fazer com isso que vocês (não) deixam aqui dentro?

("Vocês", porque eu não posso culpar a vida, visto que ela é um conceito muito amplo e eu vou acabar voltando a raiva e a frustração pra mim mesma, me disseram. Mas ninguém tem culpa, todos têm buracos, vertigens e angústias.)

Não tem um jeito de tampar isso aqui dentro não.

(E não vou publicar a imagem porque achei que ia ficar esteticamente tenebroso. Mas imaginem - que a imaginação às vezes é bem mais poderosa do que qualquer visão - aquele buraco infinito que te faz se sentir uma migalhinha. É esse que tá aqui dentro, pulsando como um coração oco.)




segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Edifício Santana Avelar

Ao subir as escadas, meu coração quase saía pela boca.
Jamais vou conseguir me esquecer da primeira, de uma intermediária, e da última vez em que eu me olhei naquele espelho que ficava logo na entrada, embaixo do qual havia uma mesinha de mármore com um enfeite de flores artificiais.

A primeira reação - o medo.
A segunda reação - o gozo.
A terceira reação - o desespero.

Minha cara de quem ia fazer algo errado, na ida, e de quem havia feito algo errado mas que não conseguia se arrepender, na volta.

Acho que o único erro real era a culpa que me assolava e desolava toda vez que tínhamos nossos encontros furtivos - que tinham que ser, afinal, furtivos, essa palavra cheia de clandestinidade. Por que sempre me foi privada a possibilidade de sentir prazer na vida? Até hoje isso não me larga. Fica grudado na minha mente, de tal maneira cortante e pulsante, que isso se traduz de forma execrável no meu corpo.

Meu corpo. Máquina infeliz que me priva de tantos, tão doces prazeres. Prazeres esses que podem não ser vida real, mas que alimentam a minha particular necessidade de sensações, bicho humano que sou.

Teve uma vez em que eu te encontrei na rua. Havia acabado de cortar o cabelo, estava feliz com a mudança recente - essa revivescência que nos ocorre quando das pequenas mudanças. Você vinha andando daquele mesmo jeito meio rebolante, meio incerto, com ar sedutor - sem medo do clichê. Jogou o cigarro fora porque, de alguma forma, isso queria dizer que você me respeitava. Que coisa engraçada de se lembrar.

Fato é que você não gostou do meu corte de cabelo. Fiquei numa decepção profundíssima mas, quando eu disse, quase firmemente, "ah! Eu gostei!", você apertou a minha mão de forma entusiástica, dizendo "muito bem, era isso o que eu queria ouvir". E o meu orgulho por ser aprovada veio todo de novo. É muito infeliz a maneira como essas sensações todas se repetem... Eu não precisava depender da sua aprovação, nem da de ninguém. Mas isso não era verdade então, e continua não sendo.

***

Aconteceu a coisa que eu mais temia: precisei fingir que você não me importava. Precisei fingir que você não existia. Precisei considerar você como um total estranho, para fugir da estranheza das circunstâncias. Não tenho como evitar a repetição da infeliz palavra "infeliz": é muitíssimo infeliz como as pessoas se tornam distantes conhecidos de uma hora pra outra - como nos diz nosso amigo Vinícius de Moraes no fatídico Soneto de separação. Não sei se você o conhece, mas procure-o um dia, se o interessar.

Verdade é que isso é verdade. E eu não tenho que me defender de qualquer acusação que seja de estar sendo leviana. Se isso não fosse totalmente real e possível e recorrente, duvido muito que teria sido registrado pelas mãos do poeta.

***

Meu coração está em um terceiro lugar que não é aqui nem lá. Minha vontade é de voltar para o centro - mas não sei que centro é esse, se ele existe ou não. O lugar aqui é insuficiente, o lugar lá, enquanto idealização, é irreal - quando se alcança o lá ele se torna aqui e assume a insuficiência característica. Existe algum lugar em que o coração repouse em paz?

Que não seja dentro de mim mesma. Aqui a bagunça é grande demais pra eu poder repousar. Me deixa não querer estar sozinha, por favor.

***

Queria não mais, nunca mais sentir a nostalgia de subir aquelas escadas frias, em que uma vez um grupo de marginais, também furtivamente, subiu, entrou na sua casa (que vivia com a porta destrancada), e levou várias coisas embora enquanto você dormia. Estamos todos, todos vulneráveis nessa vida. Com vínculos ou sem vínculos. Não há nada que nos segure. E a sensação de apocalipse é uma constante planetária - nosso inconsciente coletivo prevê o fim iminente.

Eu dispenso essa melancolia. Preciso dispensá-la.

É por isso que eu assisto aos desenhos animados, que me dão esperança e inocência.

Teve uma vez que fomos juntos assistir a uma dessas animações.

Ô maldito exercício esse, o de lembrar. Escarafunchar a mente atrás de lembranças de quando as sensações me davam a impressão de vida.

***

Um dia eu alcançarei novamente essa plenitude que eu achava sentir. Tomara que eu consiga esse feito ao mesmo tempo em que finalmente me libertarei da necessidade de dar ao meu coração um lar alheio a mim.

Como se eu precisasse de um street view pra caminhar pelas lembranças... A minha vida está mergulhada totalmente nelas.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

On saturndays...

É uma forma mais bonita de se referir aos dias de dor de cotovelo.

Top fundo do poço tracklist:

1. On satur(n)days we used to sleep - Sopor Aeternus

2. Lover, you should've come over - Jamie Cullum

3. Leather - Tori Amos

4. Na primeira manhã - Alceu Valença

Com direito a gringos e brazucas fazendo bagunça, todos juntos, no meu pobre coração.

- O sofrimento cativo:


- E o rei of them all:



E essas são só as principais. Obrigada, música. 

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Define-a-lash - A máscara


Ao chegar em casa,
Primeira coisa que faço: tirar a máscara.
Os longos cílios negros, bandeira de não sei que mistério,
Esconderam os olhos cansados com incongruente vitalidade.
24 horas de um glamour que se vai ao fim do dia,
Com a entrega ao ser-próprio:
Sem a máscara, pode-se chorar;
Pode-se esfregar os olhos de raiva;
Pode-se coçar nervosamente os cílios,
Sem que os borrões denunciem a sua fraqueza.

À prova d'água?
(À prova de vida - suor e lágrimas?)
Nunca mais compro essas máscaras
Falsas, incômodas,
Que pregam-se eternamente à nossa cara.


"Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara."
                                                                                                 Tabacaria - F. Pessoa 

E sempre vêm outros dias (ou noites)

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Sólido desejo

Nada tira de mim essa solidão da ausência dele.
(Que eu ando me convencendo de que ficou para trás
- e eu estou quase convencida.)

Nem esse desejo que me corrói as entranhas,
Que me arranca de qualquer tentativa de eixo,
Que apaga a minha empatia pela causa alheia.
(Esse papo de sonho agora é todo mentira,
E eu não faço ideia se fui em quem começou novamente com isso tudo,
Ou se eu apenas reagi inconscientemente.)

AAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHH

"Quero que ela me diga qualquer coisa para eu acordar de novo."



segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Frozen

Soubesse eu que a prova de amor verdadeiro não precisa ser necessariamente de amor romântico
A vida toda teria sido bem diferente...

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Eu finalmente me perdoei.



Querido,

Hoje, enfim, caiu uma ficha que demorou algum tempo presa entre os nós da minha mente. Aquele dia fatídico, dolorosamente histórico, deixou de ser uma dor para se tornar uma lembrança.

É claro que eu não quero, assim, me eximir da minha responsabilidade. Eu causei dor. Eu estava toda, toda dolorida, também. E é, no final das contas, essa nossa grande inexperiência com a vida que acaba criando essas armadilhas.

Estamos na vida pra isso - para machucarmos e sermos machucados. São as dores e as delícias de estarmos respirando, coração batendo, sangue fluindo e mente e emoções sempre inquietas. Sei que somos dois inquietos, é claro. De outra forma, não teríamos convergido como o fizemos.

Depois de algum tempo e de tudo o que me falaram - "esquece isso", "agora já era", "shit happens", eu finalmente consegui aceitar. Coisa de estalo, aquelas inspirações que vêm não sabemos de onde. (Na verdade eu sei, mas eu nunca consegui te contar todos os arredores que me cercavam, não é agora que eu vou tentar de novo, vamos enterrar isso de uma vez.) Pode ser toda essa coisa de Ano Novo, minhas resoluções andam tendo algum efeito... Eu finalmente consegui me lembrar de você sem sentir vergonha, sem vontade de morrer ou de esconder minha cabeça num buraco e fingir que nada existe.

Muito pelo contrário. Eu tive vontade de falar com você. 

Ia escrever essa carta diretamente, mas deixa pra lá. Você já deve estar tranquilo, e eu não quero incomodar a sua calma. Ainda mais porque eu já pedi trinta milhões de desculpas... E isso nem seria um pedido de desculpas - coisa que eu já quis fazer eternamente, mas basta, também.

Eu queria te contar que eu me redimi comigo mesma. Acho que isso pode ser o que chamam de amadurecimento. Não quero pensar que seja pura calhordice minha, porque, pra mim, chega de ser calhorda (reconheço o quanto eu fui e o tanto que venho tentando deixar de ser). Culpa é uma das coisas que eu quero riscar da minha vida, também. Então essa história não me cabe mais como vergonha.

Também queria te contar que, apesar de todos os pesares, eu gostava um tanto considerável de você, ainda que de uma maneira divergente e, talvez, exótica. E acho que é porque eu (ainda) me importo, e porque eu gostava de você se importar comigo, que eu queria te contar isso tudo - que, no fim das contas, nem deve chegar aos seus olhos/ouvidos, mas eu precisava dizer, ainda que para o nada. Ainda que ninguém leia, ou ainda que alguém leia e não saiba, exatamente, de quem eu estou falando.

(Ou ainda que você leia. Será que um dia isso vai acontecer?)

Espero que você não se lembre de mim com (tanto) rancor. Isso ainda parte meu coração só de imaginar. Mas sentir é um hábito e um vício, e quando a gente corta, fica mais fácil avaliar com distanciamento. Espero que possa ser esse o caso para você, como se tornou, de repente, para mim.

Um beijo, fique bem, e boa sorte.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Nada mais a dizer.



(Por enquanto, é claro. Sempre há o que se dizer.)