terça-feira, 5 de dezembro de 2023

rascunhos

Essa é uma história que eu não vou ter tempo de maturar, porque a cada dia o mundo se dissolve diante dos nossos olhos. Ia dizê-los "negacionistas", mas consigo ver a todos nós dando-nos conta do destino que nos aguarda logo ali, na próxima esquina em chamas.

Trinta anos atrás eu andava pelo mundo sobre duas pequenas perninhas ainda se acostumando com o próprio peso. Não entendia nada para muito além da quentura do colo da minha mãe ou da minha avó. O sabor das papas, a tela de luzes coloridas brilhando suas narrativas de colonização do imaginário.

Nove anos atrás eu vivia no fundo de uma depressão sem fundo, que hoje eu revisito com uma angústia mais lúcida, mas que ainda é a mesma angústia. Metia os pés pelas mãos achando que tudo era culpa minha, mas fazia mesmo assim o que eu pensava que queria, sem saber se era aquilo mesmo, ou não. Tudo um grande ponto de interrogação, e eu cavando com desespero um sistema de valores em um mundo que - eu não sabia - já estava se dissolvendo.

Hoje o meu corpo maduro como uma fruta madura ainda se lembra do amargor do seu verdor, doçura impregnada de ressentimento e desesperança. É possível pedir que não entreguemos os pontos quando a atmosfera não arde ao redor da nossa pele.

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