sexta-feira, 30 de agosto de 2024

queria ficar

não vai passar:
vai perder intensidade,
mas a marca fica
como tatuagem
me lembrando
da vergonha,
é claro,
mas também da coragem.

quinta-feira, 29 de agosto de 2024

em off

chega a ser violento

sua voz
ecoando
nos corredores
do meu inconsciente

terça-feira, 27 de agosto de 2024

oração

quem é você,
que eu almejo?
desde o fundo mais fundo
da minha alma estilhaçada
anseio pelo dia
da sua chegada        ou Deus, ou o Cosmos
- a resposta                não teriam me feito assim, assim
para a solidão azul       como sinto, como sou
que me assola                 porque não sei ser diferente
desde muito antes             não sei fingir, ou maquinar
de eu saber                         estrategizar formas
com o corpo                          de (im)permanência
por que fresta                         porque a honestidade é
a dor se insinua                         o primeiro passo
e penetra                                    e eu sou amor
deixando o vazio                           da cabeça aos pés
e a queixa
e a súplica
por favor
por favor
pelo menos um sinal
uma visão
em sonho ou não
                              apareça




quinta-feira, 22 de agosto de 2024

perdão

"você não me conhece"
porque você não deixa
- mas eu sou uma leitora
excelente
então eu sei mais
do que você imagina

"eu não te conheço"
infelizmente
infelizmente
porque você não quer



terça-feira, 20 de agosto de 2024

súplica

à lua cheia no perigeu

diva de melodiosas lágrimas, Chang'e
ou pai do protetor das florestas, Jaxy

carrego o cristal azul 
como uma melancia no pescoço

que me lembra da vergonha
a vergonha
pela súplica
pela queixa
por precisar provar algo
pra mim mesma
ser dilacerada por isso

há coisas de que não se escapa
o imperioso desejo
o anseio da alma

conexão
 

hooking

"When we love we can let our hearts speak." 

brokenheartedness
lovelessness
girlhood

(All about love: new visions)

quarta-feira, 7 de agosto de 2024

a mulher invisível

quem te faz se sentir visto?
quem aumenta sua solidão?
quem te aliena de si, do mundo,
e quem te proporciona
a graça do pertencimento?

os meios podem ser sombrios,
mas os olhos da intuição
enxergam bem no escuro. 

domingo, 4 de agosto de 2024

fantasias

qual é a linguagem do desejo?
para dentro, ele é apenas pensamentos.
para fora, traduz-se em gestos.
entre palavras, olhares e posturas,
vai desenhando o real concreto.

deve vir de mim, essa interrogação
que vejo se espelhando ao meu redor,
em toda relação que, trazida
para o nível de fora da minha mente,
me confronta com as minhas fantasias

e me decepciona, tanto,
tantas vezes...

deve haver um caminho para fora
em que eu possa honrar com
as palavras, olhares e posturas
em que eu me reconheço
e que não me coloquem em xeque.

(lembrar de: evitar
os caminhos que já se provaram
decepcionantes.)

sexta-feira, 2 de agosto de 2024

na ilha

de hoje resta
na parede da memória
a visão abstrata da nossa gênese política
— quem luta contra uma opressão
infinitamente maior que si
se sustenta, é claro, em seus camaradas,
mas há um preço
e, o que pude perceber,
o delírio persecutório faz parte dele —
e a visão concreta da nossa ação política
— o que é necessário à construção
de uma postura contra o fim:
organização, método,
disciplina, coragem
e o amor, é claro:
o mais radical dos afetos.

[29.07]

cortam a carne:
o vento gelado
a aflição do pensamento
o ultraje emocional
a lembrança do desprezo 

a consciência do vilipêndio
a que estamos sujeitas
há milênios, as mulheres
há séculos, os povos de Abya Yala
há décadas, os militantes radicais  

contra o
patriarcado
colonialista
extrativista
racista

[30.07]

pra não dizer que não falei das flores:
rosas são vermelhas
violetas são azuis.
quando Vênus se encontra com Júpiter
e eles passeiam de mãos dadas
pelo vale da sombra da morte
não há mal nenhum a se temer:
o que corre no fundo do poço
(do desejo?)
também é belo, porque é humano
e nada do que é humano me deve ser estranho.

[31.07]

exagium:
o ato de pensar
experimentar
traduzido em gesto crítico
para formular e dar contornos
aos nossos demônios 

(melhor não expulsá-los
porque talvez sejam eles
e os anjos
o mesmo tipo de criatura,
as duas faces da mesma moeda:
quem será a forma
e quem, o conteúdo?)

[01.08]

o hábito do autoengano

é o que fazemos
para continuar habitando
(ficar quietinhas lá,
seguras,
sem correr riscos)
o poço do desejo,
em que tudo é gozo:
pulsão introjetada,
com medo de se banhar
na luz que há

[02.08]