domingo, 23 de março de 2025

ne me quitte pas

why do you always quit me?

(você, que ganha imantação
por não sei quais vias
misteriosas)

domingo, 16 de março de 2025

sleeping with ghosts

os relevos da sua pele
nas pontas dos meus dedos:

na primeira vez, o êxtase
na segunda, o horror

(meu pensamento vaga
pelas paragens oníricas)

- em vigília eu vigio,
receosa de que você
me escute e pense
em reaparecer -

nesse opressivo dia do Sol
eu sinto o lamento preso
no centro do meu peito


sábado, 15 de março de 2025

gangorra

no vai-e-vem dos nossos movimentos
erráticos, como o dos planetas
(dependendo do ponto de vista, é claro),
o real e o virtual me confrontam
com essas presenças/ausências
que me habitam as memórias
e os espaços físicos
que não mais
compartilhamos

(para mim, a impossibilidade
está nesse desejo irracional
de dominação)

quinta-feira, 13 de março de 2025

des(a)tinos

se apaixonou pelo neto do prefeito
(lá na longínqua terra da infância,
e esse marcador de tempo importa)

se casou com o filho do padeiro

quarta-feira, 12 de março de 2025

umas e outras

ou: eclipse da lua cheia em virgem

tem as que são um tapete
atrás da porta
reclamando baixinho

(querendo provar que ainda é sua)

tem as que são pano de chão
jamais sonharão sequer
o encontro com o ferro de passar

(existirá alguém que lhe tenha
tal zelo?)

[me lembrei de uma das chicks
que disse, certa feita,
que certa fulana, chiquíssima,
ficaria linda 
mesmo vestida num saco de batatas]

terça-feira, 11 de março de 2025

um lance de dados

ou mesmo um simples
cara-ou-coroa:
em cada caso,
uma mesma e outra
revelação.

segunda-feira, 10 de março de 2025

minha guerra nunca vai ter fim

 todo dia vencendo uma rigidez cognitiva diferente

domingo, 9 de março de 2025

things i'll miss forever

being truly befriended
by those chicks who know
how to know me

quarta-feira, 5 de março de 2025

lendo Cacaso

por hoje só o poema dele, que é delicioso.


Hora do recreio

O coração em frangalhos o poeta é
levado a optar entre dois amores

As duas não pode ser pois ambas não deixariam
uma só é impossível pois há os olhos da outra
e nenhuma é um verso que não é deste poema.

Por hoje basta. Amanhã volto a pensar neste problema.



Em: Beijo na boca [1975]




segunda-feira, 3 de março de 2025

o sonho como máquina do tempo

suturando passados e futuros impossíveis:

eu a vi, jovem, alfabetizada e letrada,
seus cabelos cacheados,
minha rebeldia questionadora,
leitora de Jarid Arraes,
tutorada por Conceição Evaristo

eu o vi, adulto maduro, em riste,
uma forma que eu não conheci
- nutrida por pizzas inteiras - 
o punho esquerdo ao alto,
o mesmo olhar sorrindo, tranquilo

sábado, 1 de março de 2025

uma bailarina

que se alcança

e que também fosse a moça
que sonha o sonho do trem, à janela

ou a que está sentada, tranquila,
ignorando a visita, a notícia,
a morte e a primavera

ou mesmo a debruçada
nas varandas do sono

por certo a do hotel,
consorte de todas as outras,
que deita contigo nas nuvens

...

sem o desprezo que sofre aquela,
a que dança para viver
em vez de viver para dançar 

"I know you would like me
if only you could see me"
 

(Maybe the question is:
Would I like you
if I could see you properly?)

...

mas que desatino o meu, ora essa...
tudo o que é humano,
"só a bailarina que não tem".

anacrônica

o amor é uma farsa.
por fim, eu percebi.
ele é também uma fraude,
em que se depletam 
esperanças,
fantasias,
tempo.

(ela riu de mim quando
eu me confessei
tão sinceramente)

mas ele existe, é claro
- but not tonight, my love -

num olhar estrangeiro,
o mais intrincado dos enigmas,

ou nesse seu gesto de apontar
(o carinho de [me] perceber)
meus corações estampados,
e também o que me habita o peito

e que bate em silenciosa angústia
pela tragédia do desencontro